Regionalismo, Bairrismo e Identidade Campeira: a Preservação dos grupos locais para a valorização da Herança Cultural

Em janeiro de 1994, no 39º Congresso realizado em Esteio, foi aprovada a proposta de Ivo Benfatto definindo um “Objetivo Anual” a ser perseguido, em âmbito estadual, por todas entidades filiadas, com o fim de causar repercussão pela busca coletiva de um só objetivo.

A formação histórica do Rio Grande do Sul se deu de tal forma que possibilitou àqueles que nasceram no pago gaúcho desenvolverem grande senso de identidade e de pertencimento, elementos distintivos de nossa formação cultural e que permeiam a manutenção de nossa cultura. Desta forma, a valorização de nossa herança cultural se dá por meio do reconhecimento de nossos elementos identitários, tais como o regionalismo, o bairrismo e a identidade campeira, além do combate aos fatores de desintegração de nossa sociedade, sabidamente, o desaparecimento dos grupos locais.

De acordo com Ruben Oliven (1992, p. 19), o regionalismo “aponta para s diferenças que existem entre regiões e utiliza essas diferenças na construção de identidades próprias”. Já para Pozenato (2003, p.7) “o regionalismo pode ser identificado como uma espécie particular de relações de regionalidade: aquelas em que o objetivo é o de criar um espaço – simbólico, bem entendido – com base no critério da exclusão, ou pelo menos da exclusividade”. Para nós, do Movimento Tradicionalista Gaúcho, portanto, o regionalismo é a força integradora que articula que aproxima nossos elementos identitários, com a finalidade de criar uma identidade cultural rica e coesa.

O bairrismo, por sua vez, é a qualidade e ação do bairrista, ou seja, aquele que considera como pátria o seu estado natal e tem profundo apego e dedicação às coisas da sua terra. De forma ampla, pode-se dizer que o bairrismo é um profundo orgulho regional, característica fortemente ligada ao povo gaúcho. Tais elementos, assim como muitos outros, fazem parte da formação de nossa identidade regional e, portanto, devem ser valorizados como contributos valiosos de nossa herança cultural.

De uma mesma forma, há que ressaltar que o Tradicionalismo Gaúcho como filosofia de vida, tem na sua certidão de nascimento uma identidadeampeira. Os precursores do nosso Movimento desde o nascedouro deixaram claro a importância cultural e social daquilo que estavam fazendo, e toda avivência resgatada está ligada as atividades campesinas, visto, inclusive que o modelo dos nossos Centros de Tradições Gaúchas é inspirado em uma Estância, com toda sua divisão e nomenclatura, propostas por Glaucus Saraiva para o 35 CTG (O Pioneiro), baseadas em um local campeiro.

Nossa identidade é campeira, nossa música e poesia tem acordes de terra e vocabulário regional, nossa pilcha traz a funcionalidade para o serviço no campo, nossas danças e bailes são campesinos, somos uma figura social de fácil identificação e toda a cultura gaúcha tem raízes nos homens e nas mulheres do campo.

Nesse sentido, fica evidente os motivos de evidenciarmos no ano de 2025 os assuntos Regionalismo, Bairrismo e Identidade Campeira, sendo estes parte indissociável de nossa cultura e da construção da figura do gaúcho. Outrossim, é importante ressaltar que a valorização destes tópicos, de forma automática, nos remete à valorização de nossa herança cultural, ou seja, nos aproxima do orgulho em sermos quem somos.

Ademais, é necessário evidenciar ainda a preservação dos grupos locais como tópico de interesse para o ano de 2025. Em sua Tese “O Sentido e o Valor do Tradicionalismo” (1954), Barbosa Lessa apresentou os dois fatores de desintegração social: (I) o enfraquecimento das culturas locais e; (II) o desaparecimento dos gradativo dos “grupos locais”, comunidades transmissoras de cultura. É importante notar que, passados 70 anos, estes fatores continuam atuais.

Por “grupo local” entende-se o agregado de famílias e indivíduos avulsos que vivem juntos em certa área, compartilhando hábitos e noções comuns. São exemplos o “vizindário” ou “pago” das populações rurais, bem como as pequenas vilas do interior, ou ainda, os bairros com vida própria das cidades de alguns anos atrás. As unidades sociais pequenas estão gradativamente desaparecendo e cedendo lugar às massas de indivíduos.

Nota-se, pela análise minuciosa de nossos documentos norteadores, que as entidades tradicionalistas constituem, na atualidade, um novo grupo local. Um núcleo transmissor de herança social, de nossos hábitos, costumes, valores e princípios, ou seja, um local onde pode-se suprir a necessidade de pertencimento das pessoas e transmitir a estas um legado de cultura e valorização de nossa identidade. Portanto, a preservação dos grupos locais mbém é uma forma de valorização de nossa herança cultural e deve ser enaltecida pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho.

Sugestões de desenvolvimento de ações e atividades:
– Homenagem a Cyro Dutra Ferreira

Em 2025 é a passagem de 20 anos sem a presença de Cyro Dutra Ferreira, o tradicionalista que difundiu com sua essência os costumes campeiros da nossa gente. Suas obras, como os livros “Campeirismo Gaúcho: orientações práticas” e “Carreta Campeira”, permanecem vivas na certeza da continuidade pelas gerações. A proposta é também uma homenagem a este grande tradicionalista, integrante do Grupo dos Oito, fundador do 35 CTG e um dos idealizadores da imagem campeira do tradicionalismo.

Cyro Dutra Ferreira fez parte da comissão que elaborou o regulamento da Festa Campeira do Rio Grande do Sul, percorrendo o estado recolhendo detalhes de usos e costumes. Dos oito pioneiros, foi o mais presente no Movimento Tradicionalista Gaúcho, participando de quase todos os Congressos e Convenções, contribuindo com decisões importantes do tradicionalismo. Não foi homem de muitas letras, mas despertava a atenção dos intelectuais quando se expressava para falar de suas raízes campeiras e das tradições do nosso pago, pelo simples fato de falar com o coração e com a sabedoria da vivência.

Sempre ao seu lado, sua companheira Cyra, que juntos formaram uma família de raízes tradicionalistas com os filhos Inezita, Helio, Caio e Isabel. 20 anos de sua passagem é relembrar nosso dever enquanto tradicionalistas, é saber quem somos, de onde viemos e onde vamos chegar.

– Propor troca de experiências entre gerações a partir do resgate de práticas antigas como a fabricação de alambrados, rodas de carretas, unguentos e pomadas, embutidos (linguiça campeira, queijo de porco, salame, copa e morcilia), queijos, chimias, compotas, conservas, sucos, vinhos, entre outros.
– Realização de palestras e oficinas:

✓ Organizar eventos para discutir a importância da cultura local, envolvendo especialistas, historiadores e membros da comunidade.
✓ Realizar eventos sobre a história e a cultura do Rio Grande do Sul, abordando temas como os costumes tradicionais, história das sociedades e grupos locais, artesanato, indumentária gaúcha, instrumentos musicais, vocabulário e literatura regional, medicina campeira, evolução dos meios de comunicação como base para divulgação da cultura, resgate de festas e folguedos típicos do nosso Estado, entre outros.
✓ Prosa de Galpão: realizar conversa com homens e mulheres campeiras, sobre a importância do saber campesino, do conhecimento originário do campo, bem como, valorizar essas pessoas durante a atividade desenvolvida. Sugere-se que a “prosa” seja realizada em um galpão, mateando, para se vivenciar o momento terrunho e de pertencimento. O convite poderá ser estendido à pessoas mais velhos que contarão causos de antigamente.

– Oficinas de saberes tradicionais
✓ Promover oficinas onde os participantes aprendam e pratiquem técnicas de artesanato típicas de cada região

– Festivais e Feiras de Cultura Regionais
✓ Criar festivais que celebrem a música, dança, gastronomia e costumes locais, incentivando a participação de grupos tradicionalistas e artistas da região.
✓ Organizar festas tradicionais e feiras de artesanato, evidenciando nossos costumes, como as danças tradicionais, o chimarrão e o churrasco.
✓ Estabelecer uma agenda cultural regular, com eventos mensais ou sazonais, como concertos de música regional, peças de teatro locais, exposições de arte e sessões de contação de histórias.

– Promover o turismo regional
✓ Desenvolver roteiros turísticos que guiem visitantes por locais históricos e culturais importantes, com placas informativas e guias especializados.

✓ Organizar visitas guiadas a museus locais, igrejas históricas, sedes de bairro e outras instituições culturais, para promover o conhecimento e interesse pela história local.

✓ Incentivar campanhas de restauração e conservação de prédios históricos, monumentos e artefatos culturais, envolvendo a comunidade local e voluntários.
✓ Transformar áreas comunitárias em espaços de convivência cultural, com murais artísticos, jardins temáticos e espaços para apresentações culturais ao ar livre.

– Publicações de Materiais Educativos
✓ Produzir livros, folhetos e vídeos que documentem a história local, destacando figuras importantes e eventos significativos.

– Projeto de Memória Coletiva
✓ Coletar relatos e memórias de moradores mais antigos da comunidade, preservando histórias e tradições por meio de entrevistas e documentários.
✓ Criar plataformas online para acessar digitalmente materiais históricos, documentos e registros culturais, facilitando o acesso e a pesquisa.
✓ Utilizar plataformas online para compartilhar histórias, fotos antigas, eventos culturais e informações relevantes sobre a região.
✓ As entidades tradicionalistas, a fim do resgate de nossa identidade campeira, poderão criar MUSEUS COM ARTIGOS CAMPEIROS, encilhas, objetos de galpão, fogões etc. para recriar um cenário autêntico na entidade, principalmente com utensílios esquecidos através dos tempos.
✓ Em parceria com os governos municipais e estadual, as entidades e regiões tradicionalistas, poderão propor vitrines e ambientes temáticos em diversas épocas do ano, relembrando os acontecimentos do princípio do tradicionalismo organizado.

– Promoção de eventos e oficinas ligados à identidade campeira:
✓ Dia de Campo: realizar um dia de campo, desde cedo até a tardinha, acompanhando todo o trabalho e o dia a dia de uma família rural; uma sugestão é escolher um local com diversas das práticas campeiras, com variedade de animais e lidas, que poderão culminar com uma grande confraternização.
✓ Oficina de trança: realizar oficina com guasqueiro(a) que ensine a técnica da trança em couro cru, desde a retirada do couro, até o produto final;
demonstrar a confecção do laço, sua origem, tipos e importância para a cultura gaúcha; nesta mesma oficina, poderão desenvolver tiro de laços em vaca parada para as crianças, com a finalidade de incentivar e ensinar a importância do laço para os campeiros.
✓ Mostra de Trabalhos em Couro: através dos vários objetos fabricados com couro, realizar uma mostra dos artigos, tais como, peças de arreio, mangos, rebenques, laços, boleadeiras, barbicachos, vinchas, maneadores, acessórios de mate etc.; poderá haver a fala de guasqueiro(a) para falar de cada objeto e sua importância no dia a dia campesino; uma oportunidade para dignificar e valorizar o trabalho do guasqueiro.
✓ Oficina de Tosa e/ou Tosquia: realizar oficina com campeiros(as) que possam ensinar esses trabalhos na sua forma tradicional, suas ferramentas, cuidados com os animais, saberes populares quanto às técnicas etc.
✓ Oficina e/ou Mostra de Culinária campeira: realizar oficina de pratos típicos campeiros, como arroz carreteiro, churrasco em fogo de chão, ensopados, puchero, arroz de cola gaita, charque, doces, compotas etc.

Além disso, pode se fazer referência aos pratos típicos campeiros em cada região geográfica do RS; nesta mesma temática, poderá haver demonstração de carneação no campo; este tende a ser um evento muito atrativo para a comunidade.
✓ Palestra, exposição e/ou degustação de Café Campeiro: evento com a demonstração dos pratos do café campeiro, como pão, cuca, queijo, salame, mandioca frita, linguiça, revirado, chimias, café de chaleira (ou de cambona). O Café campeiro é considerado uma das únicas refeições confirmadas para o dia a dia dos campeiros, possuindo influência de diversos povoadores, se mesclando em cada região.

✓ Oficina de Ferragem e casqueamento: realizar oficina com profissional da área, com o ensino deste trabalho de campo; atentar para o cuidado veterinário para com os cavalos e sua importância, divulgando e conscientizando os tradicionalistas e comunidade referente ao bem-estar animal.
✓ Palestra sobre indumentária campeira, seguida de desfile e/ou exposição de peças de pilchas campeiras, demonstrando a tradicionalidade e simplicidade dos homens e mulheres do campo, principalmente com adereços e peças que não são mais utilizadas atualmente; ação sugestiva para que as prendas desenvolvem no projeto MTG e a comunidade escolar.
✓ Dia de Castração e Marcação na Estância: realizar atividade de castração e marcação em estância, promovida com explicação sobre o tema, modo e época de realização, festividade e confraternização dos envolvidos; um evento que poderá ser proporcionado para alunos das escolas do município realizador, com transporte para esse dia de campo.
✓ Oficina e Demonstração do Alambrar: realizar oficina com alambradores, demonstrando as técnicas e tipos de alambrados, bem como sua importância para a formação das estâncias e do próprio povoamento do Rio Grande do Sul.
✓ Oficina e campeonato de Jogos Campeiros: estimular a prática dos jogos campeiros nas regiões, com a explanação da sua história e motivo de criação.
✓ Ordenha gaúcha: realizar palestra/oficina/demonstração da origem da ordenha, métodos tradicionais e atuais, finalidade e principalmente a vivência com se sustentam deste trabalho de campo; torna-se necessário explanar sobre a importância econômica desta lida.
✓ Oficina de Vaca Parada: realizar oficina de vaca parada, incentivando as crianças na realização desta atividade, que de uma brincadeira torna-se aprendizado para a lida com o gado; sugere-se iniciar com o histórico de criação desta atividade e posteriormente suas regras de atividade competitiva saudável.
✓ Artesanato em lã: realizar evento, demonstração e/ou mostra de trabalhos artesanais feitos com lã de ovelha, resgatando a importância desses afazeres e objetos confeccionados.

✓ Demonstração e oficina de Doma: realizar oficina de doma, com a explicação dos diversos tipos de domas, diferenciais em cada região geográfica de saberes do estado, bem como, a demonstração da técnica em algum dos seus estágios.
✓ Evento sobre o chimarrão e seu legado de hospitalidade que permeia os hábitos campeiros.
✓ Evento sobre o cavalo e sua importância na lida de campo, os diversos afazeres e sua ligação social entre os campeiros; em continuação ao evento poderá haver demonstração de provas campeiras, tais como, rédeas, estafeta, chasque e carreiras de cancha reta, culminando com uma mostra morfológica.
✓ Cavalgada campeira: realizar cavalgada de forma tradicional entre as estâncias do município, com contação de histórias e causos, cuidados com os animais, alimentação, pouso, trajeto, entre outros.
✓ Resgate de atividades campeiras: buscar com os campeiros mais antigos aquelas atividades que eram realizadas em eventos campeiros antigamente e que hoje já não são mais habituais. Por exemplo, provas que aconteciam no Entrevero Cultural de Peões e que hoje não acontecem mais, como alambrar, ordenhar, ferrar, e atividades da FECARS como cura de terneiro, pealo, etc.
✓ Atividades de galpão: fazer uma demonstração sobre atividades de dentro do galpão, podendo contemplar as provas do Entrevero Cultural de Peões, como charque, churrasco, chimarrão, emalar poncho, trança etc.
✓ Representação dos hábitos campeiros através dos clássicos da literatura: essa atividade pode ser realizada em escolas e educandários, ampliando o conhecimento das crianças e jovens, através das obras gauchescas de João Simões Lopes Neto, Érico Veríssimo, José de Alencar, entre outros. Os autores literários trazem a identidade gaúcha e campeira em suas obras, fazendo referência a diversos termos, hábitos e costumes.
✓ Agricultura e Pecuária: palestras com agropecuaristas, agrônomos, zootecnistas, médicos veterinários, geógrafos, sobre a importância econômica e cultural da agricultura e da pecuária para o nosso estado, bem como, a realização de oficinas de manejo do gado e do solo, desde pequenas a grandes propriedades. Nesse mesmo sentido, os eventos poderão buscar a importância das hortas e plantações pequenas para o consumo próprio, a demonstração de sua criação e cuidados, objetivando um legado sustentável.
✓ A prataria gaúcha: desenvolver evento com os diversos objetos feitos com prata, outro, cobre, alpaca, demonstrando sua importância histórica e social para todos os serviços realizados.

– Atividades relativas a brinquedos e brincadeiras
✓ Oficina de brinquedos campeiros: reunir Piás, Piazitos, Prendinhas e rendas Mirins a fim de ensinar os brinquedos e brincadeiras campeiros e que podem ser confeccionados em uma estância rural.
✓ Atividades lúdicas com resgate de brinquedos e brincadeiras locais/regionais.

Peões, Guris e Piás do Rio Grande do Sul – Gestão 2024/2025
Departamento Cultural da 9ª RT, CTG Clube Farroupilha, Victória Luísa da Rosa Ribeiro, Ana Cláudia da Silva, Fernando Giacobbo Costa, Ramiro Grethe Bregles,
Maria Eduarda Lima Souza 15ª RT, Evandro Martins Otero 17ª RT, Hélio dos Santos Ferreira 8ª RT

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